Ontem assisti a "Uma mente brilhante" (2001), que conta a história parcial e adaptada do matemático esquizofrênico John Nash que chegou a ganhar o prêmio nobel de economia em 1994 graças a sua genialidade. Para mim, o filme é muito mais do que isso. Trata-se de um filme que fala sobre o amor. Um amor capaz de fazer do impossível, possível, que dá forças, esperanças.
Você pensa: clichê, clichê, clichê. Parece, eu sei, mas o contexto mostra a difícil realidade dessa aparente obviedade.
O brilhantismo não é exclusivo de John Nash. Alicia Nash, sua esposa, é o alicerce para que John tenha chegado aonde chegou. Sem ela, sua história com certeza seria diferente.
Discurso de Nash ao receber o prêmio nobel:
"Quem decide a razão? Minha procura me levou através do físico, do metafísico, do ilusório e de volta, a fazer a descoberta mais importante da minha carreira, a descoberta mais importante da minha vida: é somente nas misteriosas equações do amor que qualquer lógica ou razão pode ser encontrada. Só estou aqui esta noite por sua causa. Você é a razão de eu existir. Você é todas as minhas razões."
No começo do filme, Nash, acompanhado de seu professor, presencia uma cena comovente de um doutor recebendo canetas de seus admiradores. O professor pergunta o que ele vê. John diz "reconhecimento". O professor fala que ele não estava enxergando direito, que aquilo era realização. No final do filme, John é surpreendido com a mesma homenagem que havia assistido há anos. Fica claro então o que o professor quis dizer. Reconhecimento é esperado, almejado, massageia o ego. Realização é muito mais, é como se você acertasse as contas consigo mesmo, é auto satisfação. Reconhecimento é o exterior, realização, o interior.
"Acredito em designar valor às coisas" - John Nash.
Me lembrei desse trecho quando estava lendo uma matéria intitulada "A liberdade de ver os outros" publicada na revista Piauí deste mês. A intenção inicial deste post (além de enrolar a produção de um trabalho) era comentar apenas o texto, mas gostei tanto do filme que resolvi me aproveitar dessa interligação.
Me lembrei desse trecho quando estava lendo uma matéria intitulada "A liberdade de ver os outros" publicada na revista Piauí deste mês. A intenção inicial deste post (além de enrolar a produção de um trabalho) era comentar apenas o texto, mas gostei tanto do filme que resolvi me aproveitar dessa interligação.
A revista publicou integralmente um discurso de 3 anos atrás que David Foster Wallace fez como paraninfo dos formandos do Kenyon College. Depois de lê-lo, quis saber quem era ele: um romancista, contista e ensaísta norte americano que publicou em 96 seu livro de maior aclamação, Infinite Jest, com cerca de mil páginas. Até onde procurei, não encontrei seus livros traduzidos.
Qualquer coisa que eu escreva jamais chegaria perto do que David quis dizer, então nada melhor que reproduzir parte de seu discurso:
"Boa parte das certezas que carrego comigo acabam se revelando totalmente equivocadas e ilusórias. Vou dar como exemplo uma de minhas convicções automáticas: tudo à minha volta respalda a crença profunda de que eu sou o centro absoluto do universo, de que sou a pessoa mais real, mais vital e essencial a viver hoje. Raramente mencionamos esse egocentrismo natural e básico, pois parece socialmente repulsivo, mas no fundo ele é familiar a todos nós. Ele faz parte de nossa configuração padrão, vem impresso em nossos circuitos ao nascermos."
"Acredito que a essência de uma educação na área de humanas, eliminadas todas as bobagens e patacoadas que vêm junto, deveria contemplar o seguinte ensinamento: como percorrer uma confortável vida adulta sem já estar morto, inconsciente, escravizado pela nossa configuração padrão - a de sermos singularmente, completamente, imperialmente sós."
"A única coisa verdadeira, com V maiúsculo, é que vocês precisam decidir conscientemente o que, na vida, tem significado e o que não tem. (...) Todo mundo venera. A única opção que temos é decidir o que venerar. E o motivo para escolhermos algum tipo de Deus ou ente espiritual para venerar - seja Jesus Cristo, Alá ou Jeová, ou algum conjunto inviolável de princípios éticos - é que todo outro objeto de veneração te engolirá vivo. (...) O insidioso dessas formas de veneração (dinheiro, beleza, poder) não está em serem pecaminosas - e sim, em serem inconscientes."
"O mundo jamais o desencorajará de operar na configuração padrão porque o mundo dos homens, do dinheiro e do poder segue sua marcha alimentado pelo medo, pelo desprezo e pela veneração que cada um faz de si mesmo. A nossa cultura consegue canalizar essas forças de modo a produzir riqueza, conforto e liberdade pessoal. Ela nos dá a liberdade de sermos senhores de minúsculos reinados individuais, do tamanho de nossas caveiras, onde reinamos sozinhos."
"A liberdade verdadeira envolve atenção, consciência, disciplina, esforço e capacidade de efetivamente se importar com os outros - no cotidiano, de forma trivial, talvez medíocre, e certamente pouco excitante. Essa é a liberdade real."
"A verdade com V maiúsculo diz respeito à vida antes da morte. Diz respeito a chegar aos 30 anos, ou talvez aos 50, sem querer dar um tiro na própria cabeça. Diz respeito à consciência - consciência de que o real e o essencial estão escondidos na obviedade ao nosso redor."
Ironicamente, David se suicidou mês passado, aos 46 anos, enforcando-se.
Ao som de: Cast no shadow - Oasis